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Contando História

Cátaros, os propagadores do jogo da baleia azul no século XIII

O jogo da Baleia Azul não é coisa recente. Desde o século XIII, prática do suicídio era preconizada pelos cátaros

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Foto: Reprodução/Google

O jogo da Baleia Azul, disputado pelas redes sociais, que propõe desafios macabros aos adolescentes, como bater fotos assistindo a filmes de terror, automutilar-se, ficar doente e, na etapa final, cometer suicídio é, aparentemente, um fenômeno que começou na Rússia, mas está se espalhando – inclusive no Brasil, como sugerem o caso da jovem de 16 anos morta no Mato Grosso e uma investigação policial em andamento na Paraíba.

Na Rússia, em 2015, uma jovem de 15 anos se jogou do alto de um edifício; dias depois, uma adolescente de 14 anos se atirou na frente de um trem. Depois de investigar a causa destes e outros suicídios cometidos por jovens, a polícia ligou os fatos a um grupo que participava de um desafio com 50 missões, sendo a última delas acabar com a própria vida.

Mas isso não é um fato recente, essa história de pregar o suicídio é bem antiga e a Igreja foi a principal instituição a combater esse tipo de bizarrice na idade média, como você vai ver agora no nosso artigo.

O povo de Languedoc, no sul da França, é conhecido por ser do contra e orgulhoso de sua terra. Os habitantes daquela região se gabam de ter as videiras mais antigas do país, plantadas pelos romanos. Também empinam o nariz para o futebol, esporte mais popular entre os franceses. Lá, o que se joga é rúgbi.

Essa vocação para a dissidência vem de longe. Seu ápice ocorreu no século 11, quando cidadãos de Languedoc repudiaram a Igreja Católica – por eles chamada de Igreja dos Lobos – e fundaram um cristianismo alternativo: o catarismo.

Os cátaros formaram a sociedade secreta mais “popular” da Idade Média. Alguém falou em heresia? Para esses cristãos, herege era o papa. “Eles se julgavam herdeiros dos apóstolos e foram condenados por isso”, escreve Mark Gregory Pegg em The Corruption of Angels (“A Corrupção dos Anjos”, inédito no Brasil), que narra a trajetória da seita.

O jogo da Baleia Azul na idade média

A história dos cátaros teve um início obscuro. Em 1022, dois monges que nada tinham a ver com o movimento foram queimados vivos, acusados de adorar o Diabo. O bispo do condado de Toulouse, o maior da região de Languedoc, condenou a execução. Secretamente, ele e outros membros da Igreja já vinham discutindo idéias pouco ortodoxas aos olhos do catolicismo. Acreditavam num Deus que era puro espírito e que a matéria (corpo humano) era obra maléfica, não divina.

No século XII, 4 paróquias de Languedoc abandonaram formalmente o credo católico, abraçando as novas idéias: Toulouse, Carcassone, Albi e Agen. Por causa das duas últimas, o movimento acabou sendo chamado também de albigense.

A palavra “cátaro”, porém, só entrou para o vocabulário medieval por volta de 1160, graças a um pregador católico da Renânia chamado Eckbert de Schönau – emérito detrator da seita. Segundo uma de várias versões, o termo viria do grego katharoi, que significaria “os puros”.

A história mais aceita, contudo, é bem menos lisonjeira. Segundo Alain de Lille, um teólogo francês do século XIII, sua origem estaria na palavra catus (“gato” em latim), pois os seguidores da seita “faziam coisas ignóbeis em seus conciliábulos, como beijar o traseiro de gatos”.

Os novos fiéis estavam se lixando. Eles se autodenominavam bons hommes e bonnes femmes (“bons homens” e “boas mulheres”). E repudiavam o termo “cátaro”. Os padres se vestiam com hábitos negros. Rejeitavam o dogma da Santíssima Trindade e também os sacramentos, como o batismo, a eucaristia e o matrimônio. E viam com naturalidade o sexo fora do casamento. “Se a castidade não pudesse ser priorizada, era melhor manter encontros casuais do que regularizar oficialmente o mal”, diz a historiadora Maria Nazareth de Barros, autora de Deus Reconhecerá os Seus: A História Secreta dos Cátaros.

A nova crença também arregimentou adeptos na Catalunha, na Alemanha, na Inglaterra e na Itália.

Fogo Divino

Roma tentou conter o catarismo na base da conversa até meados do século XII, a Igreja não era e nunca foi má, o diálogo sempre foi um dos aspectos principais no combate as heresias. Quando o papa Inocêncio III assumiu, em 1198 no entanto, a atitude da Igreja endureceu.

Inocêncio suspendeu diversos bispos do sul da França. Em 1208, o representante eclesiástico Pierre de Castelnau excomungou um nobre de Toulouse. Em represália, foi assassinado.

O incidente foi a gota d’água. No mesmo ano, o Vaticano autorizou uma guerra santa contra Languedoc – a primeira e última cruzada contra cristãos da história. No cerco a Béziers, em julho de 1209, 7 mil fiéis foram chacinados, entre eles mulheres e crianças.

Em 1244, 200 cátaros foram queimados vivos numa grande fogueira nas redondezas da fortaleza de Montségur. A tortura era generalizada. O interrogador católico Guilhem Sais, certa vez, afogou uma mulher cátara num barril de vinho, pois ela não queria confessar seus pecados.

A Igreja precisou de décadas, mas finalmente conseguiu varrer os cátaros da face da terra. No coração dos habitantes de Languedoc, porém, a seita sobreviveu. O povo daquela região é do contra, lembra? Até hoje, em cidades como Montpellier e Toulouse, os revoltosos viraram até nome de rua: des Heretiques (dos Heréticos) na primeira e des Cathares (dos Cátaros) na segunda. Custou a vida de muitos, mas eles conseguiram sua revanche contra o papado. “Se existe uma coisa que os cátaros nos ensinaram”, diz Pegg, “é que as fronteiras da heresia são móveis, e que devemos ousar alargá-las.” E pelo que parece eles estão de volta com o jogo da Baleia azul.

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